Outros achados e perdidos

Por Marilene Penha Reyes
Este livro reúne uma coletânea de ensaios do autor, do ano de 1979. Profundo conhecedor de literatura, Davi nos brinda com críticas de um estilo suave, com muita clareza e simplicidade, fazendo o encontro do leitor com grandes mestres, tais como: Borges, Cortazar, Anton Tchekov, José Carlos Paes e tantos outros.

Um dos trechos mais encantadores, que provoca no leitor uma paixão singular pela literatura, se refere à sua crítica à tradução da obra prima de Carroll, a Alice…..

 

“… A tradução é uma interpretação, conversão guiada pelo sentido entrevisto, vôo cego contra alvo certo. Num momento é pura liberdade inventiva, risco pleno; noutro, é adesão ao modelo, imitação, busca de encontro e fusão no outro, como a imagem poética. Ninguém melhor que um poeta como Sebastião Uchoa para empreender esse vôo inventivo…..

O caráter estranhamente lúdico do texto…. serve de esteio para essa passagem mágica ao reino dos sonhos, do riso, do êxtase, que é o recesso da toca ou o lado do espelho, o espaço encantado a que levam as brincadeiras de Alice. Brincando, alcançamos a fonte da poesia e nestas águas somos todos jovens. Daí se percebe que o texto é para todas as idades, que não tem idade.”!

 

Davi através de suas deliciosas críticas, vai provocando uma curiosidade infinita de conhecer, de entrar neste mundo mágico e misterioso da literatura trazendo o escritor cada vez mais perto do leitor.

ARRIGUCCI JR., Davi. Outros achados e perdidos. São Paulo: Companhia das Letras.

Guerra Mundial Z

Por Antonio Marcos Panontin

A humanidade quase acabou após a epidemia de zumbis que se espalhou pelo globo. Se ficarmos apenas nessa descrição, a trama de Guerra Mundial Z seria igual à de qualquer história com zumbis. Mas as semelhanças acabam por aí e o autor Max Brooks entrega uma história ao mesmo tempo divertida, humana e inteligente.

Após o fim da guerra, um órgão da ONU decide compilar depoimentos de todo o mundo para compor uma crônica do conflito. O narrador do livro é o encarregado de viajar pelo planeta coletando as histórias. Da identificação do paciente zero, contaminado nas ruínas de uma aldeia perdida na China, até o astronauta em turno na Estação Espacial Internacional, que tem a missão de manter os satélites funcionando a qualquer custo, nada escapa ao relato do autor. Personagens distintas como a de uma adestradora de cães, um cineasta de Hollywood e um clérigo russo explicam os motivos por trás de eventos como a transformação de Cuba (o único país no mundo a escapar incólume da crise de mortos-vivos) na maior potência capitalista do pós-guerra, ou o sucesso da quarentena nacional autoinfligida por Israel.

É impressionante a capacidade inventiva de Brooks. Seus personagens são humanos, os desdobramentos sociais, políticos e psicológicos da epidemia são de uma lógica tão fundada que tornam os eventos não apenas verossímeis, mas inevitáveis no mundo da narrativa. Merece destaque também a sua prosa camaleônica, capaz de convencer nos mais variados papéis que assume.

A série de HQ’s (bem como sua adaptação para a televisão) Walking Dead também tem a intenção de, a partir de uma história de zumbis, falar daquilo que nos faz humanos. Nesse sentido, a HQ alcança um resultado pálido quando comparado com o vigor criativo de Guerra mundial Z.

Os direitos do livro foram adquiridos para o cinema e, se o filme fizer jus ao material original, será uma obra imperdível.

BROOKS, Max. Guerra Mundial Z. Rio de Janeiro: Rocco, 2010.

Livros para as férias

Por Angela Müller de Toledo

      

Livro com fôlego de férias: A menina que roubava livros. Markus Zusak. Tradução de Vera Ribeiro. Ed. Intrínseca, 2007.

Livro com fôlego de férias mas que depois fica na cabeceira: Livro do desassossego. Fernando Pessoa. Organização de Richard Zenith. 2ª ed. Companhia das Letras, 2002.

Livro para reler na praia: Neuromancer. William Gibson. Tradução de Alex Antunes. 3ªed. 2006.

Livro para ler embaixo da árvore com os filhos, os netos, o namorado (a), a mãe, o marido, a mulher, o vizinho, a prima da empregada, os filhos do sobrinho… Como é que chama o nome disso: antologia. Arnaldo Antunes. PubliFolha, 2006.

O garoto no convés

Por Andrea Luize
O mesmo autor de O menino do pijama listrado retrata neste novo livro a mudança total da vida do jovem John Jacob Turnstile. Partindo de um fato real, o motim ocorrido no navio HMS Bounty em 1789, o autor insere o garoto John nessa aventura. Depois de passar sua infância num orfanato, sofrendo abusos e sendo obrigado a roubar, o garoto de 14 anos tem sua sorte mudada, ao ser preso furtando um relógio. O Sr. Zelá, a própria vítima do roubo, o salva de uma prisão cruel, colocando-o para trabalhar num navio, de partida para o Taiti. Lá, John trabalha como ajudante do capitão, o qual passa a admirar progressivamente, embora não aprecie a vida no mar. E é a lealdade ao capitão que o levará a não se juntar aos amotinados e a passar 48 dias vagando pelo mar num pequeno bote. É essa mesma lealdade, e as experiências pelas quais passa, que farão com que ele se torne um homem e decida mudar para sempre seu próprio destino.

BOYNE, Jonh. O garoto no convés. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

Na sala de aula

Por Marilza Alberto Baptista

Na sala de aula, de Antonio Candido, é um caderno que contém 6 análises de poemas que sugerem ao prof. e ao aluno maneiras possíveis de se trabalhar o texto poético partindo da noção de que cada um requer tratamento adequado à sua natureza, embora com base em pressupostos teóricos comuns. Um desses pressupostos é que os significados são complexos e oscilantes. Outro é que o autor combina consciente e inconscientemente elementos de vários tipos.

Com maior ou menor minúcia, conforme o caso, as análises focalizam aspectos relevantes de cada poema: às vezes a correlação dos segmentos, às vezes a função estrutural dos dados biográficos, às vezes o ritmo, a oposição dos significados, o vocabulário etc.

CANDIDO, Antonio. Na sala de aula. São Paulo: Ática 1998.

Brinquedos e companhia

Por Marilene Penha Reyes
O autor analisa de modo surpreendente os brinquedos e suas implicações na vida e na cultura das crianças.

Uma reflexão do papel da produção dos brinquedos, suas implicações no universo cultural infantil, mantendo uma distância da crítica à sua indústria e chegando muito perto do lugar que eles ocupam na vida das crianças.

Os brinquedos refletem as mudanças culturais e também permitem o acesso a elas. Gilles nos mostra que eles não se limitam apenas a uma dimensão material, mas possuem significados sociais mais ou menos estáveis. É através deles que podemos compreender melhor o lugar da criança na sociedade. Eles representam antes de tudo, a relação entre o mundo adulto e o mundo das crianças.

Uma análise de grande interesse para pais e educadores. Afinal, sem criança não há brinquedo, é por ela que ele é construído; mas onde estão os adultos que os produzem? Quais as relações destes adultos com o universo infantil?

Vale a pena ler sua análise e ir um pouco mais além da nossa nostalgia em relação aos brinquedos!

BROUGÈRE, GILLES. Brinquedos e companhia. Trad. Maria Alice Sampaio Dória. São Paulo: Cortez, 2004.

O dom da história: uma fábula sobre o que é suficiente.

Por Marilene Penha Reyes
Autora de grandes obras como: “As mulheres que correm com os lobos” e “O jardineiro que tinha fé”, ganhadora de importantes prêmios literários como: Keeper of the Lore, ou ainda: Las Primeras, de Mana, da fundação Latino Nacional em Washington.

Clarissa vem demonstrar que a sequência de histórias proporciona um insight mais mplo e mais profundo do que uma história única. Uma puxa a outra, ou melhor, uma se encaixa na outra, numa alusão às bonecas Matrióchka.

Para quem aprecia boas histórias, este livro certamente vai proporcionar bons momentos e boas referências de outras histórias para além desta, como um despertar para o dom que todos têm: de viver o que é suficiente para sua própria vida.

ESTÉS, Clarissa Pinkola. O dom da história: uma fábula sobre o que é suficiente. Trad. Waldea Barcellos.  Rio de Janeiro: Rocco.

Bibliografia Brasileira de Literatura Infantil e Juvenil

Por Angela Müller de Toledo
Esta indicação de leitura é, na verdade, uma sugestão para consultas.

Trata-se da Bibliografia Brasileira de Literatura Infantil e Juvenil publicada pelo Departamento de Bibliotecas Infanto-Juvenis da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo.

A publicação relaciona os lançamentos anuais de obras literárias feitas para crianças e jovens, apresentando resenhas críticas para aquelas que se destacaram pela qualidade dentro da produção. As resenhas são elaboradas por uma equipe de especialistas.

A bibliografia é um instrumento de grande ajuda aos mediadores de leitura em geral, já que a produção editorial é muito grande e heterogênea. Ela possui vários índices para facilitar a consulta, inclusive um de faixa etária/competência de leitura.

A bibliografia pode ser consultada nas bibliotecas das duas unidades da Escola da Vila ou em todas as bibliotecas municipais de São Paulo.

As três irmãs

Por Paula Lisboa
Ao longo de sua obra, Tchekhov retratou como ninguém a tragédia do trivial, o drama permanente da vida cotidiana, mostrando aos homens o terrível caos de sua existência passageira e sem importância, explorando a realidade burguesa e expressando sua preocupação com a inação da classe média provinciana. Preocupado em mostrar o drama da trivialidade, Tchekhov nos apresenta uma sucessão de quadros registrando acontecimentos da vida de suas personagens, sem se preocupar com a construção dramática tradicional, segundo a qual deve haver o desenvolvimento de uma ação até seu clímax e desfecho. O autor sequer estabelece um conflito declarado, apresentando apenas as diferentes impressões das personagens, em que muita coisa fica apenas nas entrelinhas, ou melhor, no subtexto que deve preencher o silêncio. E o silêncio, longe de ser apenas um detalhe, é um elemento fundamental nas peças de Tchekhov, muitas vezes mais significativo que as próprias palavras.

O enredo de As três irmãs é muito simples, basicamente girando em torno da vida de três irmãs que sonham em voltar para Moscou, de onde têm lembranças felizes da infância. Com o decorrer da peça, a inação da vida provinciana e a inércia que toma conta de seu cotidiano acabam por impedir qualquer tentativa de realização desse projeto. Durante toda a trama, as irmãs, seu irmão e a cunhada, além de alguns oficiais militares que frequentam a casa conversam para passar o tempo, discursando banalidades aparentemente superficiais. No entanto, o subtexto sustenta a força do diálogo de Tchekhov, que escolhe as palavras e constrói suas frases de modo a deixar sob máscaras o verdadeiro sentido de suas falas. As personagens põem em discussão a razão da existência humana, mas com todo o cuidado do autor de não cair em nenhuma “pregação ideológica”.

Ao fim da leitura de um enredo tão simples, é incrível constatar que nossos olhos se enchem de lágrimas. O envolvimento com a vida dessas personagens é inevitável, tamanha humanidade e fragilidade com que são traçadas. Sentimos a impotência do ser humano diante do rumo de sua própria vida. E não se trata de uma impossibilidade de ação necessariamente imposta por um regime político rigoroso ou por uma sociedade sufocante, a inação é quase que opção de vida de todos eles, que não vivem, mas deixam-se viver, entregando-se mais e mais à inércia, como se fossem levados pela correnteza de um rio. É uma peça triste, onde as personagens dão pequenas “dicas” de seus maiores desejos, mas não têm coragem e força de vontade de realizá-los. Apenas sabem que “É preciso viver”.

TCHEKHOV, Anton. As três irmãs. Trad.: Clara Gourianova. São Paulo: Peixoto Neto.

As boas mulheres da China

Por Eliana Scavarelli Arnoldi
No momento em que nossos olhos se voltam cada vez mais para a gigante China, este livro nos dá a oportunidade de conhecer o peculiar tratamento que este país dispensou às suas mulheres durante os anos da Revolução Cultural.

O livro é fruto de inúmeros relatos coletados por uma jornalista chinesa, Xinran, durante os dez anos em que essa esteve à frente do programa de rádio Palavras na Brisa Noturna, uma espécie de oásis dentro da tão fechada mídia chinesa, no qual as pessoas podiam falar de seus problemas pessoais.

As histórias têm como protagonistas mulheres que devido ao peso das tradições e dos anos de totalitarismo e repressão sofreram os mais diversos tipos de violência e humilhação. São histórias como as de Jingyi que foi separada de seu amado pela Revolução Cultural e o procurou por 45 anos; a de Yang que viu a morte de sua filha durar 14 lentos dias após um terremoto e que hoje cuida de um orfanato que abriga crianças cujos pais morreram no mesmo abalo sísmico; e a de uma mulher cujo casamento foi arranjado pelo Partido Comunista.

Escritas em uma linguagem agradável e fácil, as histórias prendem a atenção do leitor a cada página graças à profundidade e sensibilidade do estilo da autora. O livro nos revela situações inimagináveis, chocantes e comoventes que aconteceram, e talvez ainda aconteçam, no gigante asiático.

XINRAN. As boas mulheres da China. Companhia das Letras, 2007.